5.5.10

guarda-chuva amarelo

Querido Orlando,

Hoje senti os teus olhos em mim. Me observaram durante um longo tempo. E por um tempo tive tanto medo de abrir os olhos e sentir os teus pousando sobre os meus, encontrando-os, penetrando-os, navegando-os, que nem me dei conta de que já estava conversando contigo, andando contigo, dividindo contigo o meu guarda-chuva amarelo. Tive medo de perder os meus dentro dos teus. Me perder em ti pra me encontrar enfim. Então virei e vi a cortina da janela balançando. E eu só queria dizer que a porta está aberta. Mas se quiser mesmo pular a janela, fica à vontade.

Da janela dá pra gente ver o sol nascendo, se pondo, as crianças correndo lá fora, brincando de gira-gira. Lá fora, a menina andando em círculos nem percebe o quanto cresceu. Volta sempre pra o mesmo lugar, mas já não é a mesma. Nunca sai do prumo, sempre andando em círculos, seguindo o ponteiro do relógio, correndo com e não contra o tempo.

Naquele momento percebi que o tempo não pode fazer muita coisa com a gente. Se todas as coisas se acabam porque o tempo é mau e não deixa que elas continuem, há uma coisa que o tempo não detém, Orlando. Palavras são à prova de tempo. Então, guardei aquela carta por dentro dos meus olhos para quando o tempo mudar, eu não esquecer você. Pra quando o tempo mudar, e o céu ameaçar explodir de tão cinza que está, você, como sempre, não me responder palavras, não me escrever palavras, mas quando o sol for sumindo, você sorrir e se encolher comigo embaixo do meu guarda-chuva amarelo.

11 comentários:

Francisco de Sousa Vieira Filho disse...

Belíssimo, singelo e tocante... algo me lembra Rita Apoena no estilo - e isto é um elogio, não um desmerecimento à originalidade que de fato tem... ;)

Anônimo disse...

lembra mesmo Rita Apoena? Ah, consegui! :)

João Gilberto Saraiva disse...

Eu gosto da leveza de suas palavras.

Bom texto, até mais doutora.

Lorena Ribeiro disse...

Perfeito!

Sara Carneiro disse...

aah, quando eu crescer, quero escrever pelo menos parecido com você *-*. nossa rutinha, o texto ficou ótimo. com certeza, um dos meus preferidos aqui no teu blog. parabéns. 3 bgs :*

GABRIEL, gustavo disse...

Queria eu saber ser tão leve com as palavras, moça.

Queria eu, um dia, encontrar um guarda-chuva desses. Mas, ultimamente, tenho aproveitado banhos de chuva, esperando ou não por ela.

Gostei. (muito)

Polyana disse...

Pois é, a menina que andando em círculos nem percebe o quanto cresceu, voltando sempre ao mesmo lugar, mas jamais a mesma. Nunca sai do prumo, seguindo sempre o ponteiro do relógio, e correndo. Mas não contra, com o tempo.

Rute, seus textos me fascinam. Muito lindo (:

Calango! disse...

Parabéns garota. Ótimo texto. Um dos mais belos que já li!

Mariana Felipe disse...

Já falei que amo como você escreve ? Se já disse, repito. E quando eu crescer , quero escrever igual a você !

Babi Leão disse...

Coisa maravilhosa é vagar pela internet e de repente encontrar um rumo aqui no seu blog ! Como escreve bem , meu Deus !
Que Ele continue te abeçoando com esse dom maravilhoso !

Anônimo disse...

assim como o Orlando, vocês são queridos!
e eu só queria agradecer.
Obrigada mesmo! :)